quarta-feira, 13 de julho de 2011

Mas que coisa!!!

Para quem gosta da Língua Portuguesa, curiosidade como esta é
interessante. Acompanhe o texto e veja que "coisa estranha"
para se pensar.

O substantivo "coisa" assumiu tantos valores que cabe em quase
todas as situações cotidianas .
A palavra "coisa" é um bombril do idioma. Tem mil e uma utilidades.
É aquele tipo de termo-muleta ao qual a gente recorre sempre que
nos faltam palavras para exprimir uma idéia. Coisas do português.
A natureza das coisas: gramaticalmente, "coisa" pode ser substantivo,
adjetivo, advérbio. Também pode ser verbo: o Houaiss registra a
forma "coisificar". E no Nordeste há "coisar": "Ô, seu coisinha,
você já coisou aquela coisa que eu mandei você coisar ”.

Coisar, em Portugal, equivale ao ato sexual, lembra Josué Machado.
Já as "coisas" nordestinas são sinônimas dos órgãos genitais,
registra o Aurélio. "E deixava-se possuir pelo amante, que lhe
beijava os pés, as coisas, os seios" (Riacho Doce, José Lins do
Rego). Na Paraíba e em Pernambuco, "coisa" também é cigarro de
maconha. Em Olinda, o bloco carnavalesco Segura a Coisa tem um
baseado como símbolo em seu estandarte. Alceu Valença canta:
"Segura a coisa com muito cuidado / Que eu chego já." E, como
em Olinda sempre há bloco mirim equivalente ao de gente grande,
há também o Segura a Coisinha.

Na literatura, a "coisa" é coisa antiga. Antiga, mas modernista:
Oswald de Andrade escreveu a crônica O Coisa em 1943. A Coisa é
título de romance de Stephen King. Simone de Beauvoir escreveu
A Força das Coisas, e Michel Foucault, As Palavras e as Coisas.

Em Minas Gerais, todas as coisas são chamadas de trem. Menos o
trem, que lá é chamado de "a coisa". A mãe está com a filha na
estação, o trem se aproxima e ela diz: "Minha filha, pega os
trem que lá vem a coisa!".

Devido lugar

"Olha que coisa mais linda, mais cheia de graça (...)". A
garota de Ipanema era coisa de fechar o Rio de Janeiro. "Mas
se ela voltar, se ela voltar / Que coisa linda / Que coisa
louca." Coisas de Jobim e de Vinicius, que sabiam das coisas.
Sampa também tem dessas coisas (coisa de louco!), seja quando
canta "Alguma coisa acontece no meu coração", de Caetano Veloso,
ou quando vê o Show de Calouros, do Silvio Santos (que é coisa
nossa).

Coisa não tem sexo: pode ser masculino ou feminino. Coisa-ruim
é o capeta. Coisa boa é a Juliana Paes. Nunca vi coisa assim!
Coisa de cinema! A Coisa virou nome de filme de Hollywood, que
tinha o seu Coisa no recente Quarteto Fantástico. Extraído dos
quadrinhos, na TV o personagem ganhou também desenho animado,
nos anos 70. E no programa Casseta e Planeta, Urgente!, Marcelo
Madureira faz o personagem "Coisinha de Jesus".

Coisa também não tem tamanho. Na boca dos exagerados, "coisa
nenhuma" vira "coisíssima". Mas a "coisa" tem história na MPB.

No II Festival da Música Popular Brasileira, em 1966, estava na
letra das duas vencedoras: Disparada, de Geraldo Vandré ("Prepare
seu coração / Pras coisas que eu vou contar"), e A Banda, de Chico
Buarque ("Pra ver a banda passar / Cantando coisas de amor"), que
acabou de ser relançada num dos CDs triplos do compositor, que a
Som Livre remasterizou. Naquele ano do festival, no entanto, a
coisa tava preta (ou melhor, verde-oliva). E a turma da Jovem
Guarda não tava nem aí com as coisas: "Coisa linda / Coisa que
eu adoro".

Cheio das coisas

As mesmas coisas, Coisa bonita, Coisas do coração, Coisas que não
se esquece, Diga-me coisas bonitas, Tem coisas que a gente não
tira do coração. Todas essas coisas são títulos de canções interpretadas
por Roberto Carlos, o "rei" das coisas. Como ele, uma geração da MPB era
preocupada com as coisas. Para Maria Bethânia, o diminutivo de coisa é
uma questão de quantidade (afinal, "são tantas coisinhas miúdas"). Já
para Beth Carvalho, é de carinho e intensidade ("ô coisinha tão
bonitinha do pai"). Todas as Coisas e Eu é título de CD de Gal.
"Esse papo já tá qualquer coisa... Já qualquer coisa doida dentro
mexe." Essa coisa doida é uma citação da música Qualquer Coisa,
de Caetano, que canta também: "Alguma coisa está fora da ordem."

Por essas e por outras, é preciso colocar cada coisa no devido
lugar. Uma coisa de cada vez, é claro, pois uma coisa é uma coisa;
outra coisa é outra coisa. E tal coisa, e coisa e tal. O cheio de
coisas é o indivíduo chato, pleno de não-me-toques. O cheio das
coisas, por sua vez, é o sujeito estribado. Gente fina é outra
coisa. Para o pobre, a coisa está sempre feia: o salário-mínimo
não dá pra coisa nenhuma.

A coisa pública não funciona no Brasil. Desde os tempos de Cabral.
Político quando está na oposição é uma coisa, mas, quando assume
o poder, a coisa muda de figura. Quando se elege, o eleitor pensa:
"Agora a coisa vai." Coisa nenhuma! A coisa fica na mesma. Uma
coisa é falar; outra é fazer. Coisa feia! O eleitor já está
cheio dessas coisas!

Coisa à toa

Se você aceita qualquer coisa, logo se torna um coisa qualquer,
um coisa-à-toa. Numa crítica feroz a esse estado de coisas, no
poema Eu, Etiqueta, Drummond radicaliza: "Meu nome novo é coisa.
Eu sou a coisa, coisamente." E, no verso do poeta, "coisa" vira
"cousa".

Se as pessoas foram feitas para ser amadas e as coisas, para ser
usadas, por que então nós amamos tanto as coisas e usamos tanto
as pessoas? Bote uma coisa na cabeça: as melhores coisas da vida
não são coisas. Há coisas que o dinheiro não compra: paz, saúde,
alegria e outras cositas más.

Mas, "deixemos de coisa, cuidemos da vida, senão chega a morte
ou coisa parecida", cantarola Fagner em Canteiros, baseado no
poema Marcha, de Cecília Meireles, uma coisa linda.


Entendeu o espírito da coisa?

Autor desconhecido

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